sexta-feira, 3 de julho de 2009

A questão racial no Brasil

Ana Cristina Ramalho

Cotas nas universidades suprem a carência de indivíduos que sofrem com o preconceito ou ele aumenta diante a esse sistema segregacional?
O possível fim do sistema de cotas das universidades do Rio de Janeiro gera intensas reflexões sobre um assunto, ainda mal resolvido, arraigado no corpo societário: o preconceito racial. Se por um lado há os que defendem a continuidade das cotas devido a uma “dívida histórica” da sociedade para com os negros, por outro, há aqueles que acreditam que a concessão das cotas por etnia acabaria por estabelecer explicitamente uma segregação interracial.
No dia 25 de maio, a Justiça do Rio de Janeiro estabeleceu a suspensão dos efeitos da Lei Estadual 5.346 que prevê o sistema de cotas para parcela de estudantes ingressarem em universidades estaduais. No dia seguinte, a Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro entrou com um recurso no Tribunal de Justiça com o intuito de derrubar a liminar que suspendeu o sistema de cotas raciais e sociais para ingresso nas universidades estaduais, adiando-a para 2010, justificando a ação pelo vestibular desse ano estar bem próximo.

A existência das cotas das universidades e o papel do governo
A criação de cotas pelo governo pura e simplesmente não atinge o objetivo ao qual se predispõe, facilitando, com o respaldo da lei, o ingresso de estudantes ao nível superior. Em conjunto, deveria haver investimentos visando melhorias na qualidade do ensino, dando condições para que todos alunos fossem capazes de entrar em universidades por méritos pessoais. Se com um elevado nível de ensino ainda fosse perceptível a necessidade de determinados grupos de serem incluídos em algum sistema de cotas, ele poderia ser instituído e sua existência nem mesmo seria discutida.
A questão que sempre surge com o debate do referido tema é o porquê de não haver investimentos necessários na área da educação. É simples, o indivíduo quando tem acesso a uma educação de qualidade se torna um ser crítico, sendo assim, é mais prudente àqueles que estão e desejam permanecer no governo criar medidas paleativas para o problema da baixa qualidade de ensino, em vez de realmente saná-lo. E o político envolvido com essas causas ainda angaria alguns votos por dar a entender que deseja, de fato, melhorar o sistema educacional brasileiro.
A imprensa, por sua vez, assume papéis antagônicos sobre o tema. Sob ponto de vista do ideal, seria possível dizer que a imprensa, não possuindo um papel manipulador, defende e acusa a proposta de cotas de maneira genuína, por seus profissionais concordarem e discordarem da temática. No entanto, a realidade se mostra um tanto quanto diferente, sendo possível, sim, que haja profissionais da área que o fazem em prol de ideologias pessoais, mas que, na maioria das vezes, baseiam seu discurso de acordo com interesses dos partidos políticos pelos quais são apoiados.
O preconceito no Brasil atual
O preconceito no Brasil existe em uma intensidade muito maior do que aparenta. A sociedade possui a falsa sensação de que preconceito é coisa do passado e que não existe mais na sociedade contemporânea, no entanto, existe e ocorre (em grande parte das vezes) de uma forma velada, que tende a ser até pior do que se fosse explicitado. O fato de todos serem iguais perante a lei e o Estado significa não que todos devem ser tratados da mesma forma, mas que todos devem receber o tratamento necessário para que tenham as mesmas oportunidades.
No caso das cotas raciais, por exemplo, ocorre um paradoxo de difícil compreensão: o desejo de inserir indivíduos no (infelizmente) seleto grupo de universitários do país através da utilização de cotas que acabam por segregar negros, brancos e pardos, determinado qual grupo terá uma porcentagem de vagas reservadas. No final, o procedimento que fora criado para unificar resulta na separação de pessoas pela cor da pele, isto é, na segregação.
Praticamente impossível algum dia ocorrer a extinção completa de todos os tipos de preconceito, uma vez que é da própria natureza humana julgar pelas aparências ou julgar sem conhecimento específico sobre o assunto ou sobre a pessoa. E, outra questão que acaba fomentando o preconceito, tanto racial, quanto religioso, é o sentimento de vingança que é fomentado na sociedade contemporânea; muitas vezes, determinadas atitudes contra específico segmento racial, cultural, religioso ou social são tidas por grupos que tem como fundamento atitudes da mesma espécie que foram cometidas sobre esses, em algum momento do passado.

E o que é a cor da pele afinal?
Todos os seres humanos são diferentes e exatamente por essa diversidade é que a espécie humana é tão encantadora. Sendo assim, as diferenças deveriam ser vistas de maneira positiva, como forma de aprendizado de uns com os outros e não como justificativa para qualquer tipo de preconceito. A diferenciação racial, sob o ponto de vista dos biólogos, não existe, visto que, é apenas a melanina o fator diferenciador, sendo esta denominação vigente somente na ordem social. A cor da pele nada mais é do que aparência, no Brasil ao menos, não existe mais (se é que já existiu) a imagem do índio puro, negro puro ou do branco puro, a miscigenação deu fim a isso. Os portugueses (holandeses, franceses, ingleses, italianos e assim por diante) desde sua chegada difundiram seus genes europeus entre os negros africanos e as tribos indígenas que aqui viviam, resultando nessa população diversificada e reconhecida mundialmente pela beleza.

“Vocês têm negros no Brasil?”
“Sim, nós temos com muito orgulho, sr George W. Bush. Todos nós somos, temos parentes ou amigos que são, graças a Deus e à maravilha da miscigenação”. Não sei se foi essa a resposta dada pelo então Presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, ao ser indagado, mas, sem dúvidas, deveria ter sido.
Até o momento, não se sabe ao certo quando (e qual) será o desfecho da suspensão das cotas em universidades, no entanto, será ainda mais gratificante o momento em que o Brasil poderá ser considerado verdadeiramente um país livre da sombra ignorante do preconceito.

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